domingo, 17 de março de 2013


'O Estado é mais forte que o crime'

Tribuna do Norte - Publicação: 17 de Março de 2013 às 00:00


Ministro da Justiça do Governo Dilma Rousseff, apontado como um dos auxiliares "fortes" da gestão. Pronto! Traçou a imagem de uma autoridade cheia de meias palavras, com muitos protocolos? Mas nada disso se encaixa no perfil de José Eduardo Cardozo. Na passagem por Natal, onde esteve para participar da homenagem ao presidente da Câmara, Henrique Eduardo Alves, e se reunir com a governadora Rosalba Ciarlini, o ministro da Justiça demonstrou praticidade e uma autoridade sem muitos protocolos. No discurso, o enaltecimento das ações desenvolvidas pelo Governo Federal, a preocupação em aumentar o número de vagas no sistema penitenciário, a ponderação com os modelos de presídios privados e a postura pró-ativa em defender a reeleição da presidente Dilma Rousseff e a aliança com o PMDB. O ministro da Justiça José Eduardo Cardozo se mostra preocupado com a participação de policiais em organizações criminosas, cobra rigor das corregedorias e destaca que é preciso uma mudança de postura dos operadores do Direito para o uso das penas alternativas.  "Onde há crime organizado existe a corrupção de segmentos do aparelho do Estado. E um dos mais graves problemas é quando isso chega ao aparato de segurança pública. A existência de crime organizado que possa ter vinculação com o aparelho policial  é algo que nos preocupa e exige a tomada de atitude", destaca o ministro. O convidado de hoje do 3 por 4 é um ministro-político, um político-ministro, mas sobretudo um cidadão brasileiro preocupado com os índices de violência e buscando medidas eficazes para combatê-la. Com vocês, o ministro da Justiça José Eduardo Cardozo.
Aldair DantasJosé Eduardo Martins Cardozo: Não costumo falar de organizações criminosas. Mas eu diria a você que o Estado brasileiro é mais forte que o crime organizadoJosé Eduardo Martins Cardozo: Não costumo falar de organizações criminosas. Mas eu diria a você que o Estado brasileiro é mais forte que o crime organizado

O senhor já recebeu notícias do momento delicado vivido pelo RN na segurança pública. O que se pode fazer por esse Estado?

Acho que hoje o problema da segurança é nacional com diferenças regionais. Há muitos anos o Brasil é um país que está muito acima do padrão desejável e apontado pelos organismos internacionais em relação a número de homicídio. Nenhum Estado brasileiro hoje está abaixo do que é considerado ideal. Infelizmente, isso é histórico no Brasil; não é de agora. O que nós precisamos captar é que nós podemos falar das causas gerais da violência e causas específicas da violência. Todas as causas gerais o Governo Federal tem trabalhado muito no enfrentamento daquilo que diz respeito a sua competência. Então estamos fazendo um plano de fronteira e fiscalização muito exitoso. É pelas fronteiras que tem entrada de armas, de drogas, o tráfico de pessoas, que acabam sendo crimes movimentados por organizações criminosas geram a violência interna. Esse é um grande desafio porque temos 16 mil quilômetros de fronteira terrestre, 8 mil quilômetros de fronteira marítima aproximadamente. Então fiscalizar as fronteiras em um país como o Brasil é um grande desafio. Estamos desde junho de 2011 desenvolvendo um programa de fronteiras, em conjunto com o Ministério da Defesa e tem sido um êxito, aumentamos muito a apreensão de drogas e a fiscalização. Esse é um ataque geral que estamos fazendo. Também temos alguns programas nacionais, sabemos que a droga é geradora da violência. O programa "Crack é possível vencer" é um programa que enfrenta as drogas e enfrenta essa situação decorrente do uso das drogas. Esse é um projeto feito pelo Ministério da Justiça. Temos alguns programas que atacam a violência nas suas causas nacionais. Mas nós temos situações localizadas e isso é o que faz com que nós desenvolvamos o programa "Brasil mais Seguro". Esse programa é de apoio da União aos Estados, feito dentro de uma ótica em que nós desenvolvemos a partir de um diagnóstico muito preciso das causas específicas da criminalidade no Estado. A partir daí são tomadas todas as medidas necessárias para que as causas sejam atacadas. E isso é o que vim tratar com a governadora Rosalba Ciarlini e um tema muito solicitado pelo presidente (da Câmara) Henrique Eduardo Alves, para nós agilizarmos ao máximo essa questão aqui.

Como o senhor analisa a relação de policiais nos crimes? No RN, o próprio secretário já apontou para participação de policiais em chacinas.

Esse é um dos problemas mais perversos que se tem em segurança pública. E não é um problema tipicamente brasileiro. Onde há crime organizado existe a corrupção de segmentos do aparelho do Estado. E um dos mais graves problemas é quando isso chega ao aparato de segurança pública. A existência de crime organizado que possa ter vinculação com o aparelho policial  é algo que nos preocupa e exige a tomada de atitude. E claro isso tem que ser feito em conjunto com os Governos federal e estadual. Da parte do Governo Federal nós temos tido ações muito importantes da Polícia Federal. Tivemos períodos recentes ações fortes em que policiais que participavam de grupos de extermínio foram presos no Estado da Paraíba, no Estado de Goiás. Portanto, temos situações muito fortes nessa linha. Agora é muito importante que nós apoiemos os Estados para que tenham corregedorias fortes, que atuem, consigam demonstrar, inclusive, para o corpo  policial que não podemos admitir nenhuma corporação elementos que conspurcam a imagem da corporação. Ou seja, é importante que as próprias corporações reajam a esse tipo de situação. Nós temos, na verdade, muita atenção para isso e, seguramente, cada vez mais os Estados se conscientizam que precisamos agir com muito rigor em relação a desmandos na área policial. Em outras palavras, o policial precisa ser valorizado, estimulado, bem remunerado. Mas por outro lado é inadmissível desvios funcionais na área policial sem punição. E ao mesmo tempo precisamos ser implacáveis contra policiais que são cooptados pelo crime organizado.

Polícia Federal e Presídio Federal são dois ícones de qualidade da segurança pública no país. Por que não se consegue levar esse modelo, já existente, para os Estados?

Os presídios federais são de segurança máxima e foram concebidos dentro de uma lógica para reunir um universo de presos de alta periculosidade. E eles têm sim um padrão de excelência indiscutível, que nós temos tentado através dos nossos programas levar para os Estados. Infelizmente, o problema dos presídios estaduais é histórico no Brasil, seria equivocado culpar este ou aquele governador, porque isso é uma coisa que se acumula. Infelizmente, o Brasil não deu atenção para o seu sistema prisional. E nem a população reconhece o esforço dos governadores quando querem melhorar esse sistema.  E infelizmente o sistema prisional virou um dos pontos de cooptação para o crime organizado. Como as condições dos presídios são péssimas, como muitas vezes colocamos atrás das grades pessoas que praticam pequenos delitos e elas (as pessoas presas) se submetem a violações de direitos básicos, elas se tornam presa fácil do crime organizado, são facilmente capturáveis. Boa parte das principais organizações criminosas que atuam no Brasil nascem como uma forma de combate as más condições carcerárias no Brasil. Temos vários exemplos de organizações criminosas que tem esse perfil. Temos que atacar duramente o crime organizado. Da mesma forma que precisamos atacar duramente a corrupção policial, precisamos de um esforço gigantesco para melhorar nossas condições carcerárias não só porque isso é uma questão de direitos humanos, mas porque é no presídio que está surgindo  a alimentação de organizações criminosas. 

Qual avaliação que o senhor faz do modelo de presídio privado, que foi posto em Minas Gerais?

As PPPs (parcerias público privadas) que tem sido usadas em alguns países são modelos que têm despertado muita polêmica de natureza financeira, da política criminal propriamente dita. O Departamento Penitenciário Nacional a nosso pedido está fazendo um estudo para analisar essas experiências, seus pontos positivos e negativos porque temos hoje um ousado programa de construção de unidades prisionais. São R$ 1,1 bilhão que estão sendo investidos para construir 40 mil unidades e mais 20 mil que foram construídos. A nossa ideia é que o Governo Dilma possibilite a construção de 60 mil vagas novas. Eu diria que não existe um modelo perfeito, todos tem prós e contras, o que precisamos avaliar é se realmente vale a pena usar certos modelos a partir dos resultados e do endividamento que ele gera. 

É um jogo em condição desleal: a população carcerária que cresce em proporções maiores do que o aumento de vaga?

Esse é um grave problema. O que precisamos fazer é construir mais unidades prisionais. Eu, sinceramente, gostaria que esse dinheiro fosse usado para construir mais escolas e hospitais. Mas eu não posso prescindir de unidades carcerárias, temos um déficit no Brasil imenso. 

E o PCC? Tem como vencer?
Veja, eu não costumo falar de organizações criminosas específicas. Mas eu diria a você que o Estado brasileiro é mais forte que o crime organizado. Se nós conseguirmos a integração necessária entre a União, os Estados e os Municípios, se nós pararmos de colocar nossas dimensões políticas ou corporativas na frente do interesse público e, para isso precisamos ter maturidade para perceber que segurança pública não é questão de governo e sim de Estado, se ocorrer essa integração vamos derrotar as organizações criminosas porque acredito muito na força do Estado brasileiro. 

Entrando no foco da política, o PT colocou o bloco na rua para campanha da presidente Dilma em 2014?

É natural, pela própria agenda eleitoral brasileira, quando se encerra uma eleição começa outra. Eu não diria que colocamos o bloco na rua, mas acho que infelizmente alguns setores da oposição, avaliando o sucesso do Governo do presidente Lula, o sucesso da presidente Dilma, tem receio que esse quadro se consolide ainda mais, aí eles (a oposição) começa  jogar o tabuleiro de xadrez na perspectiva de desencadear desagregação entre as forças governistas ou explorar situações. Hoje a oposição passa por momento difícil no Brasil e é natural que eles busquem antecipar o calendário das eleições. 

O senhor defende a reprodução da aliança do PT e PMDB?

O PMDB tem sido um grande parceiro. O vice-presidente Michel Temer tem tido papel importante na estabilidade do nosso governo. O presidente Henrique Eduardo Alves também tem papel importante no nosso governo. Como essa aliança vai se colocar a aliança, essa é uma questão que vamos discutir com os partidos da base aliada. Mas acho que PT e PMDB fizeram relação sólida no plano nacional e tem que ser mantida.